por Rita
Andréa Carvalho Pereira
Desenvolve a
escuta e promove o diálogo, facilitando a comunicação e o protagonismo da história
de cada um.
E
Júlia Ramalho
Transformadora de pessoas e empresas
na sua melhor versão.
A situação...
O pai é chamado na escola porque a
filha curte música funk. A escola sabe que a adolescente gosta das músicas e se
preocupa por ela estar disseminando músicas que sensualizam e também denigrem a
mulher. A escola pede um posicionamento do pai. O que a escola poderia fazer de diferente?
A confusão... (ou o erro)
Diante de situações que
revelam conflitos de valores, ideias prontas tendem a nos acompanhar e a causar
ainda mais confusão. Soluções autoritárias, nas quais se procura impor
determinados valores sobre outros aparecem como forma de solução para os
conflitos. Ao mesmo tempo, a escuta e as adequações são ignoradas como formas
de intervenção para impasses e divergências.
A Mediação
“Mediação é um método de resolução
de conflitos, que se dá através do diálogo, tendo
a escuta como premissa e sendo as partes assistidas por um
terceiro que as auxilia para a tomada de decisões com relação a seu desacordo.” (PEREIRA,
R. et al, 2014)
A Mediação
é uma oportunidade para se ir adiante no processo da comunicação, é uma chance
dada à palavra dita e escutada, é o resgate do diálogo como expressão ética do
ser.
No
caso acima, a
presença do mediador, um terceiro confiável, imparcial, respeitoso, com o
compromisso de transparência e sigilo, poderia ser uma aliada frente às
dificuldades encontradas na divergência entre os valores das crianças e os da
escola. A escola, como um microtecido social, é lugar de inovação e de
aprendizagem com a diversidade. É, por excelência, um lugar de escuta. Afinal, a pluralidade é uma das interfaces da mediação,
sendo mesmo uma de suas premissas.
Assim, no caso relatado,
estas seriam as perguntas a serem feitas: Qual é o conflito? Qual é o interesse
da escola? Será que a escola está se pautando por valores?
Vemos que há uma afirmação
da escola sobre o efeito do funk: as canções desse estilo musical “sensualizam
e também denigrem a mulher”. Do outro lado, temos uma criança que está
disseminando essas músicas.
Ao pensar em proibir ou
não o funk, em pedir uma atitude do pai, a escola deixa de fora a questão
e seu personagem principal: a criança e o funk.
Ter atitude e habilidade
mediadora é ser capaz de, no primeiro momento, ouvir sobre o que significa o funk
para esta criança. A criança escuta o quê? A escola escuta o quê? Se há
uma questão de disseminação, os colegas escutam o quê? Para isso, seria preciso questionar outras
escutas...
A discussão deveria, num
primeiro momento, se restringir à busca da escola pelo entendimento do que os
alunos compreendem quanto ao tema funk. Chamar os pais como autoridades capazes
de proibir e insistir que tanto a família quanto a escola se posicionem apenas
como lei e autoridade é deixar de lado a escuta. Nesse contexto, se a família
deve ser chamada, é principalmente com um intuito colaborativo, como uma
participante da questão.
E,
ainda mais importante: nenhuma proibição terá efeito sobre as crianças sem que
se saiba do que elas estão falando. Ao impor seus valores, a escola não inclui
a criança e não permite que esta reflita sobre aquilo que projeta e identifica na
música funk.
Por isso a mediação se torna uma habilidade importante:
ela busca e encontra soluções que são, realmente, viáveis.
A
habilidade de mediar pode se situar como uma prática formal da escola, ou seja,
como uma habilidade de professores e diretores na solução de conflitos. Mas ela
pode, também, ser aprendida desde cedo pelos alunos. Sendo um momento
importante para validar sentimentos, a mediação ajuda na comunicação e na
percepção do contexto: por meio dela é possível distinguir posições de
interesses, causa de causa-dor, abrindo assim a possibilidade de trabalho em
grupo, com soluções coprotagônicas.
Mais
do que ter adultos afirmando o que é certo e o que é errado, fazer os alunos
conversarem sobre o que é despertado pela música funk na escuta de uns e de
outros: através da mediação, fazer com todos ouçam e digam,
dando espaço para a diferença.
A mediação e o futuro do
trabalho
Vivemos numa sociedade
digital e, em breve, veremos transformações tecnológicas exponenciais. Isso quer
dizer que estas transformações continuarão acelerando também as mudanças da nossa
sociedade. Lidar com as divergências de valores e visões será, assim, mais e
mais uma atitude necessária.
A habilidade de mediar
será como a capacidade de fazer junto. Ao invés de apostar no conflito e na dominação,
se apostará no diálogo e na escuta. Precisaremos, cada vez mais, de
coprotagonismo: pessoas capazes de construírem soluções juntas e de lidar com
as diferenças. Esse é o grande desafio.
A complexidade da
habilidade é anunciada como uma nova profissão. Desde 2014, a mediação se
tornou uma profissão reconhecida e aceita, inclusive, nos tribunais do Brasil.
Este movimento sinaliza como a mediação será, cada vez mais, a protagonista
para a solução de conflitos, dependendo de pessoas abertas ao diálogo e preparadas
para a construção conjunta de soluções para as divergências.
Seis dicas para desenvolver a habilidade mediadora
A mediação, como profissão,
exige uma formação como mediador. Mas a habilidade de mediar pode ser
desenvolvida por meio de outras habilidades que lhe são fundamentais:
1 - Escutar-escutar-escutar:
a arte de ouvir é complexa e constitui a base de todo processo interpessoal. A
mediação, portanto, não pode negligenciar o papel da escuta. Reveja o que
falamos no blog sobre saber ouvir:
http://designersdofuturo.blogspot.com.br/2017/06/4-escuta-voce-sabe-mesmo-ouvir.html
2 - Desenvolver empatia: essa
delicada arte de sentir a dor do outro e conseguir calçar os sapatos dele
permite o avanço da mediação. Nós também já falamos sobre a empatia aqui no
blog, confira:
http://designersdofuturo.blogspot.com.br/2017/06/5-empatia-voce-consegue-sentir-dor-de.html
3 - Reconhecer que o subjetivo
(tudo aquilo que é próprio do sujeito ou a ele relativo) tem que ser levado em
conta e respeitado. Aqui, o importante é desacreditar da ideia de que se
sabe de antemão o que o outro pensa. Mais ainda: de que ele próprio já sabe tudo
sobre seu querer. Nessa perspectiva, é preciso provocar o outro para que ele fale
mais e reconheça seus valores, crenças e desejos que estão em questão.
4 - Respeitar a
diversidade é bem mais que acolher as diferenças: é abrir-se para aquilo que ainda
não se sabe, para aquilo que não se compreende. Afinal, retomando nossa
situação, o que é o funk para as crianças?
5 - Abrir mão do lugar de
colonizadores: para isso, é preciso acreditar que o outro sabe a resposta. Dar
crédito ao saber do outro é despir-se da ideia de que a minha verdade é
absoluta. A escola “sabe” que ouvir funk é errado e que deve “ensinar” as
crianças a não ouvirem, responsabilizando também os pais neste processo. Será?
Por que isso é uma verdade? Onde estão a escuta e a empatia? E o reconhecimento
da subjetividade e do “saber” do outro?
6 - Desenvolver a
hospitalidade. Para a mediação, é essencial criar um espaço de acolhida: é
preciso abertura, informalidade, pensadas desde o espaço físico para que aqueles
que já estão fora de suas zonas naturais sintam-se confortáveis. Se abrir para a
mediação é, portanto, criar também fisicamente um espaço para a abertura e a escuta,
um espaço em que todos estejam presentes para ouvir.
Além dessas habilidades, pode-se
ainda aprender técnicas e ferramentas de mediação através de cursos de formação
na temática. Entre estas, destacam-se a escuta ativa, o parafraseio, o espelhamento,
o resumo, as perguntas abertas, a redefinição de conotação positiva. A
mediação, como se vê, é uma atividade tão complexa que, por isso, além de
habilidade se tornou também profissão.
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para desenvolver sua habilidade mediadora? Compartilhe essas soluções com
a gente! Curta o artigo no blog e no Facebook, compartilhe com
as pessoas para ajudá-las a ter foco no desenvolvimento desta
habilidade.
Sobre as autoras:
Rita Andréa Carvalho Pereira reside em Belo Horizonte (Brasil) e ajuda pessoas e
empresas na mediação de conflitos, na promoção da comunicação e a assumirem o protagonismo
das próprias vidas. Faz isso há mais de 30 anos através de atendimento em
clínica. Possui formação em Psicologia, Psicanálise e Mediação. É Executive
Master en Mediación e Negociación pelo Institut Universitaire Kurt Bösch-in
Sion-Switzerland - (IUKB) y Programas de Estudios de Postergado (APEP). Como
gestora, dirige o Instituto de Mediação Aplicada (IMA/MG, www.imainstituto.com.br).
É Mediadora Judicial capacitada pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas
Gerais - Escola Judicial Desembargador Edésio Fernandes (TJMG/EJEF). Realizou
projeto de pesquisa-ação em Mediação Escolar no Centro Pedagógico da
Universidade Federal de Minas Gerais (CP-UFMG), criando o Centro de Mediação
(2013-2015). Integrante da Comissão Organizadora do Fórum de Mediação de
Conflitos, do Núcleo de Estudo, Formação, Pesquisa e Intervenção vinculado ao
Programa de Mediação de Conflitos – Secretaria de Estado e Defesa Social (SEDS-MG),
em BH, 2013. Organizadora e Coordenadora do I Colóquio sobre Resolução de
Conflitos na Universidade Estadual de Minas Gerais (UEMG), em Diamantina, 2014.
Coordenadora e autora do livro Mediação
de Conflitos: a emergência de um novo paradigma (Ed. Del Rey, 2014). Organizadora
e Coordenadora dos I, II e III Seminário Internacional sobre Mediação de
Conflitos. Participa do grupo Designers do futuro através de discussões sobre o
impacto dessas tecnologias nas carreiras e na sociedade.
Júlia Ramalho reside em Belo Horizonte (Brasil) e ajuda pessoas
e empresas a revelarem o seu melhor, ao clarear propósitos e manter foco nas
ações necessárias. Faz isso há mais de 18 anos através de atendimentos em clínica
e em coaching. Possui formação como psicóloga, coach e administradora, sendo
também mestre nesta última área. Desde 2005 vem investigando as novas
tecnologias e seus impactos para o trabalho e as futuras gerações. Como
gestora, dirige a Estação do Saber (www.estacaodosaber.com)
e foi presidente fundadora da International Coach Federation – Chapter Minas.
Coordenou projetos de discussão sobre as novas tecnologias (ETC_BH, 2009 a
2013) e de transformação da nossa cultura e sociedade (Estação Pátio Savassi, 2005
a 2013). Atualmente, vem se dedicando à construção de uma metodologia de
orientação de carreiras através de conhecimentos de coaching, design thinking e
análise de forças tecnológicas − como inteligência artificial,
internet das coisas e realidade virtual, dentre outras. Coordena e participa do
grupo Designers do futuro, que tem por objetivo promover discussões sobre o
impacto dessas tecnologias nas carreiras, na gestão e na sociedade.
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